Este é um site que o leva a um novo mundo de fantasias, onde se encontra a história do anjo Kaiser em busca de redenção... Explore as crónicas, desvende os mistérios e mergulhe numa saga de caos e esperança.
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O pecado mais horrivel, plantaria as sementes da rebelião.
Adquira o seu AgoraKaiser, um anjo banido sem explicação, desperta em uma prisão esquecida e é corrompido por uma energia cáotica. Ao escapar, encontra Haley, uma humana marcada por um destino que nem ela compreende. Juntos, fogem das forças de Lúcifer e partem em busca dos antigos aliados de Kaiser. Mas o caminho de volta ao céu é feito de sangue, e mundos distorcidos escondem horrores esquecidos, causando o despertar de algo antigo - e como ele, o próprio tempo começa a ruir.
O pecado mais horrível: Orgulho, mesmo entre os filhos da luz, plantaria as sementes da rebelião.
No princípio era o Verbo. Apenas a Luz — pura, infinita — cercava aquele que é tudo. Não havia forma, tempo ou existência além de Ele... Deus, o ser absoluto, sem início nem fim, o Senhor de todas as coisas, contemplava o vazio. E então criou a Terra — um lugar mergulhado no nada, sem forma, sem vida. Seu Espírito pairava sobre um grande abismo de águas profundas, um mar envolto em trevas silenciosas.
Então Deus falou. Mas não com palavras, nem com voz, nem com gestos. Seu comando foi essência, foi vontade pura: “Que haja luz.”
E a luz se fez. Um brilho ofuscante rompeu o véu negro, varrendo as trevas que cobriam o mundo. E viu Deus que era boa a luz. Separou, então, a luz das trevas — e assim nasceu o tempo, o ciclo e a ordem.
A partir disso, Deus criou tudo o que existe. Montanhas se ergueram do abismo. O vento ganhou forma. A terra firme surgiu entre oceanos. O fogo dançou entre as pedras. As estrelas foram lançadas aos céus como joias ardentes. Vieram os animais, os céus povoados por aves, os mares por criaturas de escamas e asas líquidas. E por fim, o ser humano — feito à sua imagem.
Mas... Bilhões de anos antes da criação da raça humana, Deus deu origem aos anjos — seres divinos, moldados em luz, com aparência celestial e asas majestosas que resplandeciam a glória de seu Criador. Eles foram os primeiros filhos, os guardiões da ordem, habitantes do plano superior.
Entre os anjos, havia uma hierarquia sagrada. Três ordens principais se destacavam: os Arcanjos, os Principados e os Anjos. Porém, sua organização não se limitava apenas às funções — também estavam divididos em cinco Classe, cada um com natureza e propósito distintos.
Esses Classe eram:
Cada Trono possuía um arcanjo como seu líder supremo:
Apesar da divisão das Classe, os exércitos celestes — as legiões — não são formados apenas por um tipo específico. Cada legião era um conjunto harmônico, reunindo querubins, serafins, Malakian’s, Hashmalins e Ishins sob uma única bandeira, organizados segundo suas missões e afinidades. Assim, o Céu floresce em equilíbrio, ordem e esplendor. Mas o orgulho, mesmo entre os filhos da luz, plantaria as sementes da rebelião...
Lúcifer, a grande Estrela da Manhã, anjo de beleza incomparável. Sua presença resplandecente despertava admiração — e inveja — até mesmo entre os mais puros celestes.
Seus cabelos castanho-escuros, levemente desgrenhados, caíam com naturalidade sobre a testa, em mechas bem definidas que lhe davam um ar refinado, mas ao mesmo tempo rebelde. O rosto era marcado por traços fortes e simétricos, com uma mandíbula firme e lábios delineados, sempre insinuando um sorriso enigmático. Seus olhos, de um tom profundo e penetrante, irradiavam inteligência e frieza — como se pudessem atravessar qualquer fachada e revelar os segredos mais ocultos. O olhar intenso era realçado pelo contraste com a pele clara, tornando sua expressão ainda mais hipnótica.
Ao seu lado estava o Primogênito, São Miguel, o Príncipe dos Anjos. Uma postura semelhante à de Lúcifer, pele clara, era alto, seus olhos dourados transmitiam poder, seu rosto era jovial, mas a força que emanava era de assustar qualquer um. Seus cabelos claros caiam na testa. Ambos eram Arcanjos de poder superior, acima dos demais em força, autoridade e glória.
Eles habitavam os altos céus, pois o Reino Celestial não era um único domínio: havia nove céus, mantidos pela árvore da vida. Cada qual com sua função, mistério e guardião. Os cinco primeiros eram liderados pelos Arcanjos: Rafael, com o Primeiro Céu, chamado Altareth Veritas, o Altar da Verdade e da Cura; Gabriel, com o Segundo Céu, conhecido como Gabza’reth, a Fortaleza do Verbo Celestial; Uriel, com o Terceiro Céu, chamado Irus, a Chama da Revelação; Lúcifer, com o Quarto Céu, nomeado Adamant, o Trono da Luz; Miguel, com o Quinto Céu, chamado Seraphéon, a Coroa dos Serafins.
Acima desses estavam os domínios sagrados: O Sexto Céu, a arena onde os anjos treinavam seus corpos e espíritos em preparação para as guerras; O Sétimo Céu, onde repousava o Livro da Vida, que continha todos os nomes dos humanos, anjos, bestas, deuses — os que viveram, os que vivem e os que ainda viverão — e registrava todo o bem e o mal do mundo; O Oitavo Céu, onde Deus repousava, envolto em silêncio e luz inacessível, separado de toda criação; E, por fim, o Nono Céu, onde se encontrava o Éden, o jardim eterno que guardava as almas dos bem-aventurados — aqueles que encontraram a salvação.
Era no Sexto Céu, envolto por colunas de luz e céu aberto, que eu me ajoelhei no centro da arena sagrada. A brisa celestial era suave, quase silenciosa, como se até os ventos respeitassem aquele lugar. Meus cabelos brancos e curtos caíam sobre a testa, meus olhos — claros como cristal — estavam firmes. Vestia o traje branco da legião de combate, semelhante a um sobretudo angelical, ajustado à cintura por uma cinta prateada, símbolo de disciplina e honra entre os nossos.
Naquele momento, eu era o primeiro guerreiro da legião de Lúcifer − o general entre os principados. E ainda assim, me curvei com respeito.
Ergui o rosto. Minha voz saiu clara, firme, cortando o silêncio e ecoando pelas paredes douradas do Céu:
— Senhor... peço permissão para duelar. Agora.
Um sorriso surgiu no rosto de Lúcifer. Ele permanecia em pé, com os braços cruzados, observando tudo de cima do pátio elevado da arena. Sua presença era esmagadora — uma força silenciosa que fazia até os mais confiantes recuarem diante dele.
— Ah... você quer lutar, general? — disse ele, a voz carregada de uma curiosidade quase divertida. Seus cabelos castanhos, parte caído aos olhos emolduravam o rosto perfeito, e os olhos de um azul profundo observavam como se já soubessem o desfecho. Ele vestia o mesmo traje que eu, mas nele, tudo parecia mais grandioso. — Eu estava mesmo querendo ver algo assim...
Ele se virou para o lado. — Por favor, Dina, acho que uma luta entre o General e a Comandante seria espetacular!
Ela assentiu com elegância. — Obrigado, lorde Lúcifer — disse, sem hesitação. Depois, voltou-se para mim com um sorriso respeitoso. — General, é uma honra enfrentá-lo aqui.
Dina também era um principado, assim como eu. Seus cabelos brancos, um traço comum entre os da nossa ordem, contrastavam com seus olhos dourados, como se guardassem a luz de mil sóis. Sua pele era clara, o rosto fino e sereno. Quem a visse pela primeira vez poderia confundi-la com uma celeste da Classe Malakian — os anjos da cura. Apesar de todos sermos guerreiros, os Malakian’s eram os que mais pregavam a paz, e Dina carregava essa mesma aura calma, tão diferente do que se espera de uma comandante dos Querubins.
Mas eu sabia. Por trás daquele semblante tranquilo, havia uma guerreira que nenhum anjo em sã consciência subestimaria. E ela agora era meu desafio.
— General, por favor, lute a...
— Estamos em um duelo. Aqui somos oponentes iguais, então me chame pelo nome, Dina — interrompi, minha voz firme, quase como uma ordem.
— Haha, claro, como quiser, Kaiser! — respondeu ela com um sorriso. A aura serena que a cercava mudou num piscar de olhos, tornando-se intensa, quase violenta. Era como se o sol tivesse expulsado toda a escuridão da noite... irônico, considerando quem eu era.
— Somos ambos Principados, então lute com tudo.
— Você é minha comandante, uma das melhores subordinadas que eu poderia ter. É óbvio que lutaria a sério contra você.
Minha aura cresceu, densa e esmagadora. Podia sentir o ar ao redor ficar mais pesado, a arena quase vibrando com a pressão. Estendi a mão na direção de Dina e, em um único gesto, liberei a névoa negra. Aquilo não era só escuridão — era como matéria condensada, tão espessa que a envolveu por completo, prendendo-a no centro do campo.
Ouvi murmúrios ao redor. Vários anjos assistiam, mas eu só focava nela. Sabia que Miguel, Uriel e Lúcifer estavam ali, sentados acima da arena, observando cada detalhe, mas nada disso importava. Se fosse qualquer outro inimigo, aquilo teria acabado ali. Mas Dina... ela não era qualquer um. Era a comandante da legião da Estrela da Manhã. A Rainha do Sol.
A escuridão começou a arder. Um fogo azul-esbranquiçado a consumia de dentro para fora. Franzi o cenho. Não era só resistência — aquilo era uma resposta.
E então percebi: ela não estava mais ali. Antes que eu pudesse reagir, senti sua presença atrás de mim. Seus punhos, envoltos pelas mesmas chamas que destruíram minha névoa, vinham direto contra minhas costas. Aquilo teria esmagado qualquer um.
Mas eu não hesitei. Girei o corpo e segurei o ataque com o braço coberto em sombras. No instante em que nossos punhos colidiram, nossos olhos se encontraram. Ela me analisava. Podia ver no rosto dela que havia notado algo. Meus olhos brilhavam, sentia isso — prateados, intensos, como um furacão prestes a devastar tudo.
Sem perder o ritmo, contra-ataquei com o outro braço. Ela segurou por instinto. Ficamos nos encarando por um instante, estáticos no meio do caos. E então, ao mesmo tempo, recuamos.
Ouvi a voz firme ecoar da arquibancada celestial. — Ótimo, isso está magnífico, mas General não deveria lutar contra General? — disse Miguel.
Reconheci de imediato aquela voz. Miguel, o primogênito. O líder dos arcanjos. O único que ousava se sentar ao lado de Deus. Seu tom era sempre calmo, mas carregado de autoridade.
Uriel, ao seu lado, virou-se para ele com um olhar curioso. — O que você quer dizer, irmão? — perguntou.
Mesmo à distância, consegui sentir a força bruta daquele arcanjo. Uriel era intimidador por natureza. Pele clara, olhos castanhos penetrantes, cabelo curto e um corpo moldado pela guerra. Ele não era grande, mas sua forma lembrava a de um guerreiro calistênico — compacto, firme e letal.
— Irmão, quero dizer que traga o seu General para um combate com o tão famoso Anjo das Sombras. — respondeu Miguel.
Minha respiração se manteve constante, mas meu olhar se fixou neles. Aquilo era sério, mais do que parecia. — Hm, entendo... isso parece divertido, Miguel! — disse Lúcifer com um leve sorriso, como se aquela ideia o agradasse mais do que deveria.
Uriel cruzou os braços, sua expressão endurecendo. — Miguel, você quer causar um caos no céu? Dois generais lutando seria extremamente perigoso... um embate que poderia acarretar desastres até mesmo na Terra.
Fiquei em silêncio, observando, esperando. Eles falavam de mim como se eu não estivesse ali. Como se eu fosse apenas uma peça num jogo que já conheciam bem demais. Foquei em Dina, ela esquivava bem. Bem, até demais.
— Ah, não seja tão exagerado, é apenas um treino — ouvi Miguel dizer, tentando aliviar a tensão.
— Bom, se você está dizendo Zenguerió — falou Uriel, estalando os dedos enquanto pronunciava o nome do General dos Hashmalins.
Em um instante, um principado apareceu diante de nós. Era forte, musculoso, cabelos curtos, o rosto, braços e pernas marcados por cicatrizes, embora cobertos por um sobretudo branco que não escondia a imponência daquele guerreiro.
— Você irá duelar com ele. — Anunciou Uriel, apontando para mim. — Dois generais, dois principados. Não me decepcione, Zenguerió.
O Hashmalin respondeu com uma voz que ecoava como trovões, forte e imponente, como se mil raios colidissem contra o metal. — Sim, meu rei.
Olhei para eles, já entediado, sentindo o peso daquele desafio. — Senhor, preciso mesmo enfrentá-lo? — perguntei, a voz carregada de impaciência. Dina estava ao meu lado, silenciosa, observando.
Lúcifer levantou-se, segurou a mão de Dina com gentileza e respondeu: — Por favor, general, se meus irmãos querem tanto, lute! Ele voltou o olhar para Dina e continuou: — Minha rainha, por favor, pode vir?
Dina segurou a mão de Lúcifer com firmeza e se colocou atrás do trono da Estrela da Manhã. Do centro da arena, vi Zenguerió caminhar com passos pesados, sua aura era selvagem, agressiva — como a de um caçador que finalmente encontrara sua presa.
Ele parou a alguns passos de mim. Nunca havíamos nos enfrentado antes, mas eu já ouvia falar da força daquele Hashmalin. Ele parecia ansioso demais, como uma fera prestes a perder o controle. Já eu, permaneci calmo.
Zenguerió empunhou uma longa espada e, sem hesitar, arremessou-a em minha direção com uma força esmagadora. Inclinei o corpo levemente, sem esforço, e a lâmina passou por mim, cravando-se com brutalidade em uma arquibancada atrás de mim. — Não diga para mim que vai lutar sem nada? — Provoquei.
— Querubim arrogante, morra! — rosnou em resposta.
Num piscar de olhos, ele surgiu bem à minha frente. Senti o ar se deslocar antes mesmo do golpe atingir. Um chute giratório acertou meu estômago com força. Fui lançado para longe. O impacto ressoou pela arena. Poeira subiu por todos os lados.
Ouvi a risada de Zenguerió do outro lado, debochada, como se não acreditasse que aquele golpe já era suficiente para acabar comigo.
Meus olhos acenderam, então ele hesitou. Por instinto, saltou para o lado. Talvez nem tivesse entendido o porquê... até que a escuridão explodiu no centro da arena. Uma esfera negra, densa, violenta, engoliu metade do mármore sagrado.
— Desviou disso? — minha voz ecoou da nuvem de poeira enquanto ela começava a baixar.
Vi olhos se voltarem para mim. Lúcifer sorria do trono, curioso. — Realmente, você é bem poderoso! Ah... — Soltei um grunhido de tédio. — Que canseira você arrumou para mim, portador da Luz.
Estiquei os braços, alongando os ombros. A dor do chute já havia desaparecido, substituída por algo mais interessante: empolgação. — Acho que vou lutar sério contigo. — Falei.
Num piscar de olhos, desapareci. Surgi ao lado de Zenguerió e, sem permitir reação, meu punho acertou seu rosto com força. O impacto o lançou pelos ares, mas eu já estava à frente de novo antes que seu corpo encontrasse qualquer superfície. Chutei-o com firmeza, mandando-o voar na direção dos tronos dos Arcanjos. Seu corpo se chocou violentamente contra a parede, ao lado dos assentos celestiais. Mais uma nuvem de poeira ergueu-se no ar.
Um grito ecoou. Em seguida, senti as rajadas. Energia bruta veio em minha direção como tiros de luz descontrolados. Minhas pupilas brilharam em prata. Observei as investidas de energia, uma a uma. Meus pés se moveram quase por instinto, desviando com facilidade. Nenhuma sequer me arranhou.
Consegui ouvir parte da conversa dos Arcanjos acima. Suas vozes, embora distantes, carregavam um peso que atravessava o campo. — Isso está ficando divertido! — comentou Miguel.
— Eu também estou achando! — respondeu Uriel com aquele tom sempre calculado. — Porém, isso vai acabar logo, logo. — E por que acha isso? — Miguel perguntou.
Uriel fez uma pausa. Mesmo de onde eu estava, pude sentir o clima mudar. — É que, meu General, não é um celeste comum. Sua força é esmagadora, até mesmo para o Behemoth.
Behemoth? O nome ecoou em minha mente. Algo naquilo me incomodou, como se algo estivesse para acontecer. — Do que você está falando? — foi Lúcifer quem perguntou, curioso.
— Bom, eu ia tratar disso na reunião, mas... — Uriel apoiou o cotovelo no braço de seu trono, descansando o queixo na mão. Sua expressão era fria. — Durante a patrulha, senti algo incomum. Fui verificar e, em poucos segundos, fora, Behemoth conseguiu soltar um dos braços. Zenguerió conseguiu segurar. Saiu com um ferimento na perna, mas já se curou.
Meu olhar se manteve em Zenguerió, que já se levantava no meio da poeira, mas as palavras de Uriel não saíam da minha mente. — E os pilares? — ouvi o Príncipe perguntar. Meus punhos se cerraram. Vou acabar com isso logo.
— Intactos. — respondeu Uriel, com aquela calma assustadora que ele sempre mantinha. — Mas algo chamou minha atenção.
Continuei observando o campo, mas meus ouvidos estavam focados no que acontecia entre os tronos. A luta com Zenguerió tinha pausado por segundos, mas algo naquele diálogo estava me chamando mais atenção do que o combate. — O que chamou sua atenção? — perguntou Lúcifer.
Uriel hesitou por um instante. Senti que o que viria em seguida não seria pouca coisa. — Bom, não sei quem era... — começou ele. — Mas tinha uma velocidade esmagadora. Eu não consegui ir atrás.
Um silêncio. Quase desconfortável. Até que a voz do Príncipe dos Anjos irrompeu como um trovão: — Você viu alguém que, aparentemente, é um inimigo e ele ainda respira?!
Uriel permaneceu impassível, como se não tivesse sido atingido pela acusação. — Eu vou matá-lo. — prometeu ele. — Da próxima vez que cruzar comigo, trarei o coração dele.
Eu já conhecia Uriel o suficiente para saber que aquilo não era bravata. Ele falava como um executor. Frio. Direto. E, normalmente, mortalmente eficaz.
Zenguerió avançou, invoquei minha escuridão, elas saíram como tentáculos da minha sombra, agarrando o general. Então me movi, com uma força sobrenatural, lancei de volta para trás.
A conversa ainda se prosseguia. — Calma — Lúcifer disse, com aquele tom leve, quase debochado. — Não importa quem ou o que seja. Nada vai conseguir vencer Uriel. Não é mesmo, irmãozinho?
— Com certeza. — Uriel respondeu com naturalidade. — Vou preparar um grupo de caça... preciso de anjos rastreadores.
— Se me permite — ouvi a voz de Dina, ao lado de Lúcifer. Ela se adiantou um passo, com a serenidade firme que sempre demonstrava. — O General é um ótimo caçador. Sua visão é a melhor que temos.
Meus olhos se voltaram lentamente para Uriel. Sabia que ele não gostava de intromissões, especialmente vindas de alguém fora de sua ordem. E, como esperado, o olhar dele foi afiado ao fitar Dina. — Por acaso... — disse ele, mais ríspido. — Eu lhe dei permissão para falar?
Me mantive em silêncio, mas meu punho se fechou por reflexo. Ainda assim, Dina não desviou os olhos. Ela era assim: teimosa, corajosa e estranhamente calma, mesmo diante de figuras como Uriel. Aquilo não ia acabar bem.
— Calma, Uriel! — disse Lúcifer, sua voz cortando a tensão como uma brisa leve num campo de guerra. — Desculpe a grosseria do meu irmão, minha querida...
Olhei de canto para Dina. Ela continuava impassível, mesmo sendo alvo direto da irritação de Uriel.
— Você está certa. — Continuou Lúcifer, se voltando para o Príncipe dos Arcanjos. — Kaiser é o melhor que temos, irmão! Estou lhe permitindo levar cinco dos meus. Cinco nomes. Não esqueça, e os proteja se necessário.
Vi quando ele se levantou, o punho fechado e foi levantando os dedos um por um, nomeando como se lesse uma lista sagrada.
— Kaiser. Querubim. Principado de nível General. Excelente em combate corpo a corpo. Observação: domínio em combate à distância, estrategista, ágil, inteligente. Um ótimo cão de caça.
Assenti discretamente. “Cão de caça”, hein? Bom, não é mentira.
— Dina. Querubim. Principado de nível Comandante, mas seu nível real já é General. Letal tanto de perto quanto de longe. Feroz, brilhante. Perfeita para a missão.
Meu olhar cruzou o dela. Não dissemos nada, mas sabíamos o que significava sair juntos em missão oficial outra vez.
— Darius. Hashmalin. Guerreiro. Um monstro em rastreio, força bruta absurda, olfato tão preciso que parece trapaça.
Imaginei a fera em ação. Darius tinha seus próprios métodos, mas ninguém podia negar sua eficiência.
— Liz. Serafim. Sensível, mas extremamente hábil com elementos naturais e tudo que é mundano.
— Fairy. Malakian. Cura e suporte. A base viva de qualquer equipe que queira voltar inteira.
Uriel concordou com a cabeça, como se já esperasse tudo aquilo. — Eu agradeço, irmão. — disse ele, sóbrio.
— Eu também mandarei cinco dos meus. — Miguel falou então, após longo silêncio. — Mas amanhã você os conhecerá.
Antes que pudessem seguir falando, o grito ecoou. O som pesado, gutural, como de um animal ferido.
Voltei minha atenção ao campo de batalha. Zenguerió arfava como um touro, o sobretudo em pedaços, o corpo coberto por poeira. Ele avançou, dessa vez mais rápido, aparecendo na minha frente, segurando uma esfera de energia esbranquiçada, acertou a queima-roupa em mim.
Voei para longe, chocando-se em uma plataforma de concreto. Uma nuvem de poeira subiu. Um tempo se passou e saí andando, a escuridão envolta do meu corpo.
Minha respiração estava firme. Minhas roupas já não existiam da cintura para cima. Restava apenas a calça de couro escura e as botas pretas. Senti o corte raso em meu braço, mas era insignificante. Meu peito subia e descia devagar, controlado. Estava me divertindo.
As cicatrizes antigas do meu corpo contavam histórias demais para que esses arranhões me incomodassem.
Zenguerió era maior. Muito maior. Mas não era sobre força bruta. Era sobre saber quando e como usar cada brecha. Quando ele rugiu, avançou... já não estava ali. O chão explodiu sob o impacto de seu golpe, mas girei no ar, e minha bota se chocou contra o lado de sua cabeça. Senti o crânio dele ceder levemente sob o impacto.
Fraquejou. A brecha de que precisava. Aterrissei em frente a ele num salto baixo, agarrei sua cabeça com ambas as mãos e desferi a joelhada com precisão. O estalo foi alto, e o sangue respingou no meu rosto. O nariz dele estava em pedaços.
Mesmo assim, o grandalhão não caiu. Com um urro de pura fúria, me empurrou com força. Dei dois passos para trás e deslizei no chão, cravando o pé para frear.
— Nossa. Caia de uma vez! — reclamei, com a voz carregada de tédio. Já estava me enchendo essa enrolação toda.
Zenguerió cambaleou, mas não caiu. Aquele monstro ainda tinha mais para mostrar, aparentemente. — Não vai me vencer só com isso. — Retrucou ele, arfando. — A gente nem elevou nossa aura ainda!
Foi então que vi seus olhos acenderem num azul intenso, quase cortante. Por um instante, tudo à minha volta ficou branco demais. A luz em volta do corpo dele explodiu como se o próprio céu tivesse descido à arena.
Tapei os olhos com o braço. Aquilo não era só para brilhar — era uma tática. Queria me cegar, me fazer perder o ritmo. Mas não funcionaria comigo.
Quando a luz se dissipou, encarei a cena com atenção. Zenguerió estava como novo. Nenhum arranhão. Sua respiração firme, como se tivesse acabado de acordar. O filho da mãe havia se curado completamente.
Ele uniu as palmas das mãos e um vento pesado soprou por toda a arena. Senti meus cabelos se moverem, o ar estava mais denso, carregado. Sua aura, agora visível, girava ao redor do corpo como uma tempestade dourada. Notei as mudanças físicas — as presas, os pelos surgindo na pele, as garras. Era uma transformação clara, um modo de combate selvagem.
Eu preparei o corpo, firmei os pés no chão. Estava pronto.
— Vamos começar. — disse ele.
Mas não teve tempo. Uriel apareceu na minha frente num piscar de olhos. Nem vi de onde surgiu. Ele estalou os dedos. Em menos de um segundo, Zenguerió caiu no chão como um saco de pedras. A transformação cessou por completo.
Observei aquilo com a sobrancelha arqueada. Uriel, sempre dramático, mas eficiente.
— O que está fazendo? — gritei, tomado pela fúria. Meu combate, e agora Uriel estava se metendo?
— Calado. — respondeu o Arcanjo com a frieza de sempre.
Antes que eu pudesse dizer qualquer coisa, ele estendeu a mão em minha direção. Foi como se o mundo tivesse virado ao avesso.
Uma dor esmagadora tomou conta de mim. Não veio de fora, mas de dentro, como se o próprio ar tivesse decidido me destruir. Senti meu corpo colapsar. Sangue saiu pela boca, pelos olhos, pelo nariz... até pelos ouvidos. Tudo ficou turvo.
Tentei me manter de pé, mas minhas pernas já não obedeciam. Caí. Antes de perder completamente a consciência, ouvi a voz dele, distante, quase abafada: — Temos uma missão urgente. Não temos tempo para briguinhas...
Acordei com um gosto metálico na boca. Estava deitado. A primeira coisa que notei foi o teto: alto, de pedra branca cintilante... Adamant. O Quarto Céu. O Céu de Lúcifer.
Me sentei com esforço, massageando a têmpora. O golpe de Uriel agora fazia sentido. Ele não me acertou com força bruta, mas com pressão. Compressão atmosférica. Ele manipulou o ar ao meu redor, esmagando tudo de dentro para fora.
Que técnica, filha da mãe, mas eficaz.
— General, o senhor acordou. — disse uma voz feminina.
Virei o rosto e vi Kaya se aproximando. Morena, olhos intensos como brasas vivas, cabelos pretos e lisos que caíam pelos ombros como véu escuro. Sua presença sempre vinha com uma certa gravidade.
— Kaya? O que faz aqui? — perguntei, surpreso.
— Lúcifer me mandou ver como você estava. Se já estivesse acordado, era para levá-lo ao salão principal. Teremos uma missão. Com o Arcanjo Uriel. — disse ela com naturalidade, como se eu não tivesse quase morrido há minutos atrás.
— Ah, claro. — Suspirei. — Vamos.
O salão principal era grandioso, até mesmo para os padrões de um céu. Andei por ele observando os detalhes com mais atenção dessa vez. Mármore branco no chão, tão polido que refletia como espelho. As paredes também de mármore, mas com veios dourados que se entrelaçavam em padrões vivos. Os pilares, maciços e feitos de ouro puro, sustentavam a abóbada celestial.
No centro, uma fonte jorrava água cristalina, formando um brilho que dançava nas paredes. Nas quatro extremidades, portas imponentes guardadas por estátuas feitas inteiramente de diamante, representando os grandes reis celestiais de outrora. Respirei fundo. Algo grande estava por vir, e Uriel estava no meio disso.
Chegamos ao salão. Os passos ecoavam no mármore. Lúcifer estava no centro, de braços cruzados, com o olhar fixo em nós. A presença dele era sempre intensa, como se até o ar ficasse mais denso ao redor.
Então ele falou, com aquela voz que carregava poder e suavidade ao mesmo tempo:
— Eu os reuni aqui para informá-los de que vocês seis vão sair em uma missão com o meu irmão Uriel. A princípio seriam só vocês cinco, mas Kaya pediu para ir, então permiti. Escutem bem: Uriel será o líder da missão, vocês o seguem, porém, não esqueçam que o General de vocês é Kaiser.
Senti todos os olhares se voltarem discretamente para mim. Permaneci imóvel. Apenas firmei os pés no chão e mantive a postura. Eu não precisava de aprovação, mas era bom lembrar a todos quem era o comandante em campo.
— Sim, senhor! — todos disseram em uníssono.
— Senhor, qual será a missão? — perguntei.
— Que bom que perguntou, Kaiser. A missão será investigar quem ou o que libertou Behemoth, talvez vocês entrem em um combate. Então, atentos!
— Certo! — todos novamente.
— Vocês seis se juntaram a dez membros da Legião de Uriel e cinco da de Miguel.
— Estão indo muitos para uma única missão?! — Falou Dina.
— Sim, rainha. — Respondeu à estrela da manhã. — Aparentemente, é uma missão perigosa, então irão muitos de vocês.
— Entendi.
Assim que a reunião terminou, o grupo começou a se dispersar. Fomos liberados para nos preparar.
Deixei o salão com passos longos. Dina, Kaya e Liz vieram atrás. Era bom tê-las comigo — confiava nas três, cada uma à sua maneira. Seguimos em direção ao jardim.
Liz andava ao meu lado esquerdo. Seus cabelos ruivos se destacavam contra o branco do ambiente, longos e ondulados, balançando com leveza. Os olhos dela tinham aquele tom amarelado raro, quase dourado, como se guardassem a luz do pôr do sol. Usava o uniforme padrão: sobretudo branco até os joelhos, ajustado na cintura, e por baixo, uma calça de couro marrom.
Apesar da aparência delicada, Liz era mortalmente eficiente — principalmente quando lidava com o mundo material.
O jardim estava silencioso, apenas o som da água correndo nos canais de pedra e algumas folhas sopradas pelo vento. Um lugar de paz antes da tempestade.
Observei meu grupo por um momento. Não éramos apenas soldados. Eu era o General.
Abaixo de mim vinha Dina — Comandante da Primeira Divisão, feroz, precisa, estrategista. Depois, Ramiel, que não estava presente, comandava a segunda divisão. E Kaya, que liderava a Terceira com pulso firme e um senso de dever inabalável. Todos os principados. Todos testados em campo.
— General, algum comando? — perguntou Dina, como sempre firme e direta.
Olhei para cada um deles. Não podia confiar cegamente em ninguém, principalmente em alguém como Uriel.
— Sim. Abram os olhos. Não confiem totalmente em Uriel. Mantenham-se atentos. É isso.
— Sim, senhor! — responderam em uníssono.
As horas passaram rápido demais. Quando percebi, já estávamos nos aproximando do portão do Terceiro Céu — Irus, o domínio de Uriel. O céu dele era mais frio, uma calma estranha pairava no ar, como o silêncio antes de uma explosão. Dina, Kaya, Liz, Fairy e Darius me seguiam.
Mas algo me incomodou no mesmo instante em que avistei o campo de reunião. Sem contar Uriel, só havia dezesseis anjos ali. Fiz as contas mentalmente.
“Seis de Lúcifer, cinco de Miguel, dez de Uriel. Lúcifer foi claro. Mas onde estão os anjos de Miguel?”
Parei, observando tudo em silêncio.
Uriel apareceu com aquele sorriso forçado que ele sempre usava. Falsamente cordial. — Olá, querubim, obrigado por aparecer! Obrigado a todos...
Não aguentei. Dei um passo à frente e perguntei, direto: — Uriel, onde está a ajuda de Miguel?
Ele sustentou meu olhar com um pouco de desdém, mas respondeu com naturalidade ensaiada: — Verdade. Ele disse que ajudaria. Porém, desmarcou. Disse que não podia ajudar dessa vez.
Travei o maxilar. Claro que Miguel recuaria. Mas por que agora?
Algo estava fora do lugar. E eu odiava quando as peças do tabuleiro começavam a se mover sem que eu fosse avisado. — Entendo... — murmurei, encarando Uriel. — Nesse caso, devemos ir logo. — Cruzei os braços, ainda atento a qualquer sinal fora do normal.
Uriel assentiu com um leve sorriso, então se virou para todos os presentes. — Escutem bem — começou erguendo a voz. — Irei explicar a situação. Alguém conseguiu libertar Behemoth. Por sorte, conseguimos acorrentá-lo novamente, mas se existe alguém capaz de quebrar as correntes forjadas pelo próprio Deus, então essa criatura precisa ser eliminada.
Permaneci em silêncio, absorvendo cada palavra. Aquilo confirmava o que eu já suspeitava, essa missão não era comum.
— Ele é um possível inimigo — continuou Uriel —, e nós iremos caçá-lo. Quando o encontrarmos, eu mesmo o matarei.
Olhei para Dina, depois para Liz. Todos estavam sérios. A atmosfera era pesada.
— Eu poderia ir sozinho — completou Uriel —, mas preciso da ajuda de vocês. Então, meus irmãos, começa agora a nossa missão.
Me mantive calado, mas por dentro, algo me dizia que estávamos prestes a entrar em algo muito maior do que simplesmente capturar um fugitivo. Que tipo de ser poderia libertar Behemoth?
Ficção Científica
Janeiro 2026
Português
Digital & Impresso
Estamos preparando algo especial para você. Em breve, "Asas em Ruínas" estará disponível em todas as principais plataformas de livros.
É um escritor apaixonado por ficção científica e fantasia, com uma imaginação fértil e talento para a construção de mundos. Dedica seu tempo a criar histórias que transportam os leitores para universos inexplorados. Asas em Ruínas – Herdeiro do Caos é seu primeiro livro de ficção científica e fantasia, fruto de anos de trabalho e dedicação.
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